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Lições da História

Os historiadores possuem um árduo papel, tentar contar o que aconteceu sem expor sua opinião, sem deixar que suas inclinações pessoais influenciem a seleção de material para contar uma estória. (ainda existe a diferenciação de história, História e estória?). Naturalmente, sabemos que essa é uma tarefa impossível, portanto, ao ler qualquer relato devemos nos perguntar, o que mais será que ocorreu aqui? Toda história é afinal incompleta e provavelmente errada.

Logo no primeiro capítulo/introdução os historiadores Will e Ariel Durant colocam o centro de seus objetivos: ao estudar o desenrolar dos fatos, devemos conseguir obter algum ganho que o passado possa oferecer frente a nossa própria vivência. Isto é, o estudo além das nossas vidas deve(?) contribuir para encontrarmos padrões e, de certa forma, prever o futuro?

O livro foi lançado em 2018, e não contempla acontecimentos recentes, sendo mais focado em passar uma perspectiva mais geral da história, como ela se limita e quais lições podemos tirar dos relatos e fatos passados.

A maior parte da “história” é adivinhação e o resto, pré-conceito.

Por sua incompletude, a história não pode ser uma ciência. Precisa ser encarada como uma forma de arte e filosofia. Na definição dos Durant, história é “troublesome duplexity”.

A história é submissa da geologia. O clima pode não nos controlar de maneira imperiosa como outrora, os avanços tecnológicos fazem com que prosperemos e cultivemos em lugares inóspitos. Contudo, o clima (ainda) nos limita. Tornados podem arruinar em poucas horas cidades que levaram séculos para serem construídas.

Mas tudo começa na geografia, com as cidades bebendo da fonte dos rios, e as rotas de mercadoria sendo trilhadas pelos seus cursos. O berço das grandes civilizações, Egito, China, Índia e Itália, foram os grandes rios, e, mais tarde, com a expansão de cada império, seus afluentes.

A invenção do avião altera então a forma como construímos cidades, pois não precisávamos mais, necessariamente, estar baseado perto de um grande volume de água fluída. Países como França e Inglaterra começam a perder sua importância marítima, em detrimento de outras “potências” como Rússia, China e Brasil (grandes em território, começam a perder a desvantagem econômica quando não estão fadados a transportar pessoas e bens pelo país apenas pela rota cara terrestre). Assim, a importância da geografia na modelagem da história vai perdendo importância à medida que a tecnologia evolui.

A história é submissa então à biologia, que nos ensina que para sobreviver temos que competir e cooperar. A guerra surge como o meio de competição entre nações e cooperação dentro da nação.

A natureza, também é celetista. Durant alfineta: a mãe natureza não leu a declaração da independência americana ou a dos direitos humanos da revolução francesa, perante Dela, nascemos desiguais e somos seus escravos.

Deixem os homens livres e suas diferenças iram se multiplicar em projeção geométrica

Para os autores, apenas o homem abaixo da linha mediana deseja a igualdade, pois todos aqueles que são conscientes de suas habilidades superiores, desejam a liberdade plena. A utopia da igualdade é, uma utopia. O que devemos almejar seria um sistema legal justo e oportunidades iguais para educação.

Também colocam que a natureza nos mostra que ela está mais interessada no coletivo do que no indivíduo, e na necessidade da reprodução para produzir variação.

Um pouquinho agora sobre raça e o arianismo, que surge em 1853 com o escritor Comte Joseph de Gobineau. O arianismo seria a crença de que existe uma raça superior (de traços brancos) e que as grandes civilizações viriam delas. Obviamente essa noção é deturpada, enviesada e estreita. Não nos aprofundaremos nela, mas sabemos que essa crença moldou profundamente a história do lado oeste do globo, com implicações também na outra metade do globo.

Temos cerca de 2bi de pessoas “de cor” no mundo. E pouco mais de 900 milhões de “brancos”

A história é cega, e desenvolve civilizações grandiosas em qualquer pele”.

Dos gregos até o sul da Itália, do império romano até o europeu “moderno” do Oeste, e chegando nos EUA. O papel da raça não passa de um pano de fundo para justificar a barbárie. Circunstâncias, geográficas, econômicas e políticas criam uma cultura, e a cultura cria “um tipo de ser humano”,

Os autores atestam que a discriminação racial pode ter início (ou justificar-se na superfície) por uma diferença étnica. Contudo, são o resultado de uma mistura de pontos antagônicos: linguagem, moda, hábitos, moral e religião. Não há cura para o preconceito, exceto a educação, e a certeza de que para triunfarmos como espécie, precisamos de cooperação e diversificação.

O que definiria “ser humano”? Um conjunto de sentimentos, atos, instintos? Sabemos que muitas dúvidas existem sobre esse “ser humano” (aqui, estou tentando explorar o filosófico e não o biológico), e o que de fato é inato e o que é moldado pela sociedade em que vivemos. Cada insistindo que temos, sendo o mais básico da sobrevivência, geraria hábitos comuns, similares e sentimentos mútuos.

A história confirma (um pouquinho) essa visão. Os meios e instrumentos, mudam. Mas os motivos e os fins, permanecem os mesmos. A conduta do “ser humano” permanece inalterada. Somos seres complexos e relativamente novos na escala evolutiva, e o que nos molda e seleciona é muito mais social do que biológico.

Um Pasteur, um Morse, um Edison, um Ford, um Wright, um Marx, um Lenin, um Mao Tse-tung são efeitos de um sem-número de causas com efeitos sem fim. [só exemplo de homens! E as mulheres?? Cadê??]

A história é, no final, o resultado do conflito das minorias. Cada minoria tem seu conjunto de regras morais que devem ser seguidas, e o choque entre esses conceitos, entre as adaptações dos ambientes ecológicos e sociais que nos permeiam retroalimentam a sociedade e a própria história.

Em uma época em que a taxa de mortalidade dos homens era infinitamente maior que a das mulheres (por serem quem caçava), a poligamia provavelmente era o mais comum. Hoje, na maior parte dos países ela é condenada. Filhos outrora já foram um instrumento de trabalho (economic asset) e hoje são, para muitos, um fardo que consome seu poder econômico. Controle de natalidade migrou de pecado para comum.

A história escrita, registrada é um pedaço do que ocorreu. Geralmente, registramos o extraordinário, mas vivemos o comum dia após dia.

Não podemos passar esse relato sem discutir religião. Apesar de estar ligada a moral, inicialmente, a religião não parece ter surgido como um pilar de integralidade, mas os “Deus vem para suprir nossos medos, especialmente o medo do desconhecido”. A religião é a história sem fronteiras, pois se proclama como o conjunto de regras que são identificáveis além dos limites políticos. Mas a política, consegue adentrar até a religião, às vezes declarando mais liberdade (Estado laico) às vezes trazendo mais tirania (impérios).

Holy days -> holidays

O ateísmo sempre esteve presente. Na época de Buda, era comum na Índia, e Buda funda uma religião sem Deus. Com sua morte, as pessoas se apropriam do budismo e acrescentam deuses, santos e o conceito de inferno.

Não há um exemplo significante na história (até agora) de uma sociedade existir (desenvolver?) com uma moral específica sem a ajuda da religião (isto é, de um conjunto de regras morais que regem uma conduta esperada em troca de uma salvação). O Governo pode se dissociar da religião, mas é ela que ajuda o Estado (mesmo após o “rompimento”) a manter a ordem social.

Enquanto houver pobreza, haverá Deuses

GOVERNOS

Deixando o espiritualismo de lado, vamos entrar no assunto que vem me mantendo bastante ocupada: economia. Para Karl Marx, história é economia em ação. É o resultado da competição dos indivíduos e grupos pelos bens que nos são escassos: comida, combustível, material, e, em última instância, poder.

Grandes movimentos históricos ocorreram devido a motivação econômica, de ter mais poder, de ter mais dinheiro. As cruzadas, as guerras de Roma e Persia, a revolução Francesa… A evolução dos sistemas econômicos faz com que o homem “escolha” entre ser empregado do capitalista ou do Estado. Os banqueiros estão na ponta de tudo, seja do capitalista proprietário, seja do Estado;

O homem que consegue gerenciar homens, gerencia o homem que consegue gerenciar somente coisas. O homem que consegue gerenciar dinheiro, é o homem que gerencia a todos.

A concentração de riqueza/terras é um resultado natural da concentração de habilidade de cada homem. [não concordo com essa frase, mas deixo ela aqui como está no livro]. Regimes déspotas tendem a retardar essa concentração, a democracia, por ser o regime “libertário” tende a acelerar a concentração de riqueza pelos mais aptos.

Quando a concentração de riqueza atinge um limite, duas coisas podem ocorrer (segundo os autores):

  • Redistribuição de riqueza através de legislação
  • Redistribuição de pobreza através de revolução

Em Roma, vimos a primeira tentativa (registrada que temos conhecimento) de reforma agrária, proposta por Tiberius Gracchus e rejeitada pelo senado. Segue-se uma profusão de eventos com Tiberius clamando uma revolução pelo povo, e culminando em sua morte ordenada pelo próprio irmão. Várias trocas de poder conflituosas… até a Pax Romana instaurada por Octavius.

A revolução francesa ensaiou também uma reforma, mas transferiu o poder/terras da aristocracia para a burguesia. O governo Americano fez pequenas transferências de terras entre 1933-1952 e 1960-65.

Com todo o relato de reforma agrária, puxamos o fio do socialismo. Os autores relatam um pouco das experiências socialistas nas diferentes civilizações, começando pela Suméria em 2100 antes de cristo. No código de Hammurabi (Babilônia, 1750 A.C.) existem taxas fixas para artesãos e médicos. O governo Egípcio, porém, é o que tem mais registros de um “socialismo estruturado”, em que o Estado regulava o solo e o que era plantado, a produção de óleo, sal, papiro e tecidos (ou seja, o comércio era regulado pelo Estado). No império Romano, a experiencia mais social ocorreu sob as mãos de Diocletio, com grandes obras públicas sendo bancadas pelo Estado e com distribuição de comida para os pobres.

A China também teve diversas tentativas de implementar regimes socialistas, com Scuma em 145 A.C, e Wu Ti (140 A.C -87 A.C), tudo corria bem até que grandes secas causaram um colapso e revolta da população. Mais recentemente, Wang Mang (9-23 A.C.) conseguiu reviver algumas ideias de Wu Ti, mas foi deposto pela elite que perdeu poder e lucro com sua ascensão (mais uma vez, a seca, as enchentes e invasões ajudaram a deposição de mais um socialista). Alguns milhares de anos depois, em 1065-85, Wang Na-shiih iniciam mais um governo em que o estado controlaria o comércio, a indústria e a agricultura e provendo ajuda para os necessitados (idosos, desempregados, pobres) e reformando o sistema educacional. Os ricos, mais uma vez “penalizados”, iniciaram o boicote do Estado, e quando, mais uma vez a seca e a fome atacaram, o regime cai mais uma vez.

Até onde se sabe, o regime socialista de maior duração ocorreu onde hoje é o Peru, administrado pelos Incas, em que absolutamente todos eram funcionários do Império Inca. O sistema não veio abaixo pelos próprios controlados, mas encontrou seu fim com a conquista da região por Pizarro em 1533.

Todos os relatos até aqui são colocados como uma experiencia socialista, antes mesmo desse regime ser definido por Karl Marx e Friederich Engels no manifesto comunista de 1847. Após as ideias publicadas, as experiencias modernas socialistas são as ocorridas na Rússia (1917) e em Cuba.

De forma geral, os homens apreciam a liberdade. Mas a liberdade individual é restringida quando vivemos em sociedade. Essa restrição se dá por meio de regulamentos, pactos entre os indivíduos que culminam em uma forma de governo. O poder, quando diluído, é minimizado. O poder é engrandecido quando concentrado. Mas como definir o poder hoje? Cada país tem seu governo estruturado de uma forma, mas todos (ou quase todos) participam de uma economia comum global de uma forma cooperativa (?) como nunca vista antes.

Qual seria a forma ideal de governar? Quais são os parâmetros pelos quais iremos julgar o que é bom?

Em termos de duração na história, a monarquia é o sistema mais estável. Após isso, o outro exemplo que temos é do período da Pax Romana, com imperadores (similar à monarquia, mas o poder é entregue de forma gradual ao mais apto, e não necessariamente aos descendentes).

Ao fim ou ao cabo, governos são oligarquias (controladas por poucos), seja ela escolhida por nascimento (aristocracias), pela religião (teocracia) ou pela riqueza (democracia). [Um breve comentário aqui, vários comentários dos autores para mim são errados, ou, melhor dizendo, apresentam frases simplistas e com uma interpretação de visão de mundo diferente da minha. Aqui, tento colocar as notas como os autores escrevem e percebem/documentam a história. Lembremo-nos que eles mesmos dizem que a história é multifacetada].

As revoluções não são capazes de redistribuir a riqueza efetivamente, e o tempo acaba por reconcentrar a riqueza. A minoria no poder pode ser trocada com uma revolução, mas segue sendo um sistema oligárquico, com privilégios para quem controla o sistema. A única revolução verdadeira é o “iluminismo”, isto é, a educação e melhoria individual de cada um, que gerará sociedades mais justas.

A democracia é nossa experiencia mais fraca, curta e recente. De todas as formas é também a mais difícil, pois exige “a maior inteligência da população geral” para funcionar. E a inteligência sempre está limitada a oportunidade de desenvolvimento cognitivo que se dá a uma pessoa (e os mais pobres, além de terem menos oportunidade, são os que mais se reproduzem). Dito isso, os autores expõem que nas democracias, o grau de manipulação também será o mais exacerbado.

CONFLITOS

A guerra é uma constante na história. Dos 3.421 anos que se tem registro mais exato, apenas 268 (8%) deles não tiveram conflito armado em alguma localidade do globo. As causas da guerra são as mesmas de competição entre os seres individuais: comida, terra, bens, poder. Os autores colocam então o prognóstico de que, sempre estaremos, em algum momento do espaço-tempo, em guerra. É possível que globalmente uma nação controle todo o globo (em uma forma de Pax Romana internacional), mas ainda assim conflitos insurgiriam. A única forma das nações se unirem seria em torno de um inimigo comum extraterreste.

O FIM

Se a história se repete, devemos esperar que, a todo tempo nações morrerão e outras serão criadas. As novas gerações se rebelarão, depois se conformarão. As regras morais serão testadas, flexibilizadas, retomadas… Não há certeza de que o futuro repete o passado, cada ano é uma aventura, com um novo detalhe acrescentado, no desenrolar dos fatos. Mas os estágios das civilizações são os mesmos: surgem, desenvolvem-se, decaem, desaparecem.

As causas de decaimento geralmente são comuns, concentração excessiva de riqueza, somada a períodos infortúnios do clima (chuvas, secas, enchentes, tornados…), ameaças de invasão externas (imaginárias ou não)… O decaimento então surge como resultado da inabilidade do líder atual em lidar com os problemas do presente (e ninguém está dizendo que isso seja fácil).

Filosoficamente, civilizações não morrem. Seu conhecimento, especialmente quando registrado, são passados para as gerações futuras. Nações, estas sim, morrem, pois não passam de contratos.

“Como a vida se sobrepõe à morte com a reprodução, assim uma cultura envelhecida passa seu patrimônio para seus herdeiros através dos anos e dos mares. A civilização não é herdada; ela precisa ser aprendida e conquistada por cada nova geração.”

Quais seriam então as lições que tiramos da história registrada, estudada, avaliada?

Será que passamos os instintos mais banais, somos mais tolerantes, avançamos progressivamente como espécie ao longo dos anos? Se progresso for definido como o aumento do controle do ambiente, então sim, progredimos. Aumentamos nossa expectativa de vida na maior parte do globo consideravelmente, mas ainda somos incapazes de prever o clima ou que dirá controlá-lo. Ainda somos [como a atualidade nos revela] cheios de preconceitos e intolerância.

No sentido de transmitir conhecimento, chegamos ao ponto mais avançado da história. Podemos não ter os maiores gênios, mas seguramente aumentamos a média do conhecimento global do ser humano. Em países desenvolvidos/em desenvolvimento as universidades já são numerosas. O que antes era reservado à elite, agora é alcançável (mesmo que não seja no mais alto rigor).

 

Afinal de contas, o maior legado que construímos como raça é a passagem de conhecimento entre as gerações. A história é, assim, a criação e recriação da nossa própria herança.

Gostei muito de algumas visões desse livro, que é curtinho e ótimo para relembrarmos da história aprendida no colégio (e a não aprendida também). Algumas frases e percepções para mim são simplistas/contra o que pessoalmente acredito, mas é o ponto de vista dos autores e merece ser lido e refletido.

 

 

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