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A estrutura das revoluções científicas

O livro A ESTRUTURA DAS REVOLUÇÕES CIENTÍFICAS do autor THOMAS KUHN, foi uma leitura árdua que exigiu de mim grande concentração para seguir sua prosa e compreender sua mensagem. Apesar de ser uma leitura citada em várias outras obras, o livro em si não me apeteceu muito, quando comparado as outras leituras que venho realizando.

 

Apesar disso, a obra cumpre seu papel em trazer um novo olhar para como encaro a ciência e minha própria postura como pesquisadora dentro do meu trabalho formal.

 

Vem comigo para um resumo (dessa vez raso) das ideias de Kuhn sobre as revoluções científicas!

Resumo

É difícil dizer se o livro é filosófico ou de cunho histórico. O próprio Kuhn se colocava como historiador da ciência (profissão que eu nem sabia que existia!) mas a maneira como ele coloca suas ideias me soa muito mais discursiva/argumentativa que factual. Os fatos presentes no livro têm função muito mais exemplificativa que documental.

 

No livro, o autor atesta que revoluções científicas existem (ainda que silenciosas) de maneira estruturada e se dão em etapas bem definidas: primeiro há o desenvolvimento da ciência normal, que se dedica a solucionar quebra-cabeças. Em seguida, na tentativa de juntar as peças, anomalias são identificadas (peças erradas? De outro conjunto talvez?) e nos levam a uma crise que só é resolvida com a adoção (ou seria invenção?) de um novo paradigma.

 

Paradigma, aliás, é um termo polêmico nessa obra. À época de Kuhn o termo não era tão comum e foi após seus escritos que o jargão “mudança de paradigma” foi cunhado. O termo é central para o entendimento de sua obra e de maneira simples podemos defini-lo como modelo a ser imitado. Em uma definição mais robusta, pelo autor é definido como “realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência”

 

Outra palavra chave na leitura é a incomensurabilidade. É a ideia de que, durante a crise, as novas ideias (que compõem ou tentam moldar um novo paradigma) não podem ser estritamente comparadas com as antigas. Isso ocorre pois o significado que se dá a cada termo é diferente em cada paradigma, assim como os problemas que cada conjunto de ideias se propõem a resolver. Dessa maneira, um novo paradigma não é escolhido porque é melhor ou mais verdadeiro, e sim porque de adequa na nova concepção de mundo.

 

E quais problemas são importantes? Onde nossos recursos, atenção, dinheiro e pessoal deveria ser alocado? Seria o progresso uma linha reta rumo à verdade? Para Kuhn (e não é difícil deixar-se convencer) a resposta para essa pergunta é um sonoro NÃO. Mudamos nossos paradigmas com o intuito de resolver os problemas que nos parecem mais importantes, mas nada garante que fazemos as escolhas certas.

 

 

Ainda sobre vocábulos, é preciso lembrar que o próprio termo revolução à época do livro não era tão ligado à inovação quanto é hoje em dia. Ao contrário, na américa do norte, o vocábulo revolutionary era usado para referir-se a comunistas, inimigos do estilo e governo americano.

A rota para a ciência normal

O ensaio de Kuhn se inicia com a definição da “ciência normal”: pesquisa firmemente baseada em uma ou mais realizações científicas passadas, documentadas em manuais de referência.

 

O que prepara um membro da sociedade científica é justamente o domínio do paradigma, baseado nos manuais, e não nas leituras, divagações e pesquisas que debateram as teorias ou paradigmas vigentes.

 

Kuhn considera-se um historiador da ciência, e aponta como essa área evoluiu para, não apenas retratar a evolução das teorias ou dos paradigmas, mas também documentar como o mundo era visto na perspectiva da época. Assim, não basta saber que o teocentrismo é uma teoria falha, mas entender por que foi considerada válida, qual eram os problemas que resolvia (e quais não resolvia). Essa visão é esclarecedora para entendermos quais os caminhos que a ciência toma.

 

Esse caminho é especialmente árduo, pois envolve a necessidade de um consenso entre diversos pesquisadores que tomam decisões aparentemente ao acaso. Afirmar isso parece blasfêmia, mas a realidade é que, na ausência de um paradigma que guie uma área para resolver certo problema, os fatos (ou problemas) que identificam uma área da ciência parecem igualmente relevantes. Assim sendo, a coleta inicial de dados está ligada diretamente à disponibilidade dos próprios dados. Por sua vez, a disponibilidade de dados está à mercê do avanço tecnológico da época em que se dá o embate conceitual.

 

Chegar a um consenso significa aceitar um paradigma como melhor que seus concorrentes. Isso não significa que uma teoria A explica todos os fatos que B. Por isso, a “briga” entre A e B também se dá na definição de quais problemas são mais relevantes para a sociedade naquele momento histórico. A concorrência entre A e B também pode ser vista como a existência das chamadas “escolas”, em que cada grupo se dedica (ou devota-se) a uma teoria.

 

Quando um dos grupos “ganha” cada vez mais adeptos, diz-se da chegada em um consenso. Por (muitas) vezes, o consenso chega apenas com o passar dos anos e a literal morte daqueles que defendem uma determinada teoria.

 

Além da divisão de escolas, que estudam paradigmas concorrentes, a especialização é um tema tangente no livro. Para o autor, a especialização é natural como o surgimento das espécies, que diante de uma adversidade natural (uma crise conceitual) se subdivide em espécimes. Também os cientistas se separam em pequenas comunidades que seguem paradigmas (ou disciplinas) similares, mas não totalmente iguais. À medida que as teorias se confirmam (são capazes de resolver mais e mais problemas) as comunidades podem se reunir e se ramificar como a evolução das teses.

 

 

Assim se dá a rota para a ciência normal, que forma pesquisadores nichados em suas áreas de pesquisa, leitores assíduos de manuais, experimentadores e articuladores da teoria em voga.

A natureza da ciência normal

O sucesso de um paradigma está ligado à relevância dos problemas que ele é capaz de resolver e dos que ele tem potencial para resolver. A ciência normal centra-se em expandir o número de problemas resolvidos. Inclusive, alguns cientistas são considerados como bem-sucedidos não por suas descobertas ou inovações, mas pela precisão de resultados que confirmam um determinado paradigma.

As famosas leis da química e da física, por exemplo, muitas vezes foram “adivinhadas” com base na articulação de paradigmas vigentes, anos antes de poderem ser confirmadas e testadas por meio de experimentos. Por esse motivo, os problemas emergentes da articulação de paradigmas são fundamentalmente teóricos e experimentais.

 

A ciência normal consiste em resolver (poucos) problemas que permanecem sem solução dentro de uma teoria aceita. Dessas soluções, espera-se pouca novidade conceitual ou identificação de novos fenômenos. Tais problemas, podem ser divididos em três categorias:

  1.  Determinação de fatos significantes: a teoria explica apenas uma parte dos problemas e deixa uma série de outros explícitos de forma qualitativa, são os experimentos que “determinam os fatos” de maneira mais precisa;
  2.  Pareamento de fatos com a teoria: é a prática da experimentação que deve se curvar ao pré-estabelecido pela teoria. Se algo está errado é provável que o experimento não tenha sido bem preparado ou executado;
  3. Articulação da teoria: processo de trazer à luz, tudo que está implícito em uma teoria.

Assim, surgem três ciências: a teórica, a experimental e a instrumental. Essas últimas duas são pouco abordadas por Kuhn. Curiosamente, é a parte mais palpável da ciência para grande parte da sociedade, que admira esse campo muito mais pelas inovações tecnológicas instrumentais do que pelos avanços teóricos.

 

O ponto 2 nos leva a refletir sobre a característica humana tendenciosa de ver o que esperamos, mesmo quando a coisa não está lá. Quando acreditamos em um paradigma somos fiéis a ele e culpamos o experimento, o experimentador ou a fase da lua antes de culpar a teoria. Isto é, o reconhecimento da anomalia dentro da fase da revolução é a etapa mais problemática. Reconhecer uma anomalia significa reconhecer que nossas crenças são falhas.

 

Anomalias: recusam-se a serem absorvidas por qualquer paradigma vigente. Assim, após seu reconhecimento, a busca por um novo paradigma se inicia. Essa busca, contudo, não é desamparada do antigo paradigma, pois rejeitar um paradigma sem simultaneamente substituí-lo por outro é rejeitar a própria ciência, para parafrasear o autor.

 

A descoberta não surge quando algo caminha corretamente, mas quando alguma coisa se desvia; uma inovação é aquilo que vai contra ao que é esperado.

 

É a ciência que observa e experimenta, que restringe a extensão de nossas crenças. Elas testam a teoria e apontam as anomalias. Uma outra maneira de ver a ciência normal é que esta tenta devotadamente forçar a natureza aos conceitos fornecidos pela educação formal. Quando os membros da profissão não conseguem mais forçar a natureza (quando a pilha de anomalias começa a incomodar), começa então à investigação do novo olhar, do novo conjunto de regras que atualizarão ou modificarão por completo o paradigma vigente.

 

Abandona-se então o paradigma. A ciência que ele define deixa de existir. Seria o início da revolução? 

A ciência normal como resolução de quebras-cabeças

A ciência normal dedica-se na resolução do quebra-cabeças imposto pela teoria aceita. Assim, sua capacidade ou tendência a inovação é reduzida, pois busca respostas em um universo “conhecido” pela teoria. As explicações são dadas com base no paradigma vigente, e se o resultado não coincide com o esperado, tem-se uma pesquisa (e um pesquisador) fracassado.


A analogia ao quebra-cabeças é muito bem feita por Kuhn porque esse defende que a ciência busca resolver problemas justamente que apresentam solução (ainda que não revelada). Um paradigma que permeia uma área da ciência define os problemas que está apta a resolver, define as peças e a orientação para a imagem formada geral. Assim, um cientista engajado possui a convicção que a resposta pro seu problema existe, basta dele engenhosidade suficiente (que ainda não ocorreu a nenhum de seus pares) para resolver o problema.

A prioridade dos paradigmas

Neste capítulo, o autor elabora mais sobre sua perspectiva da ciência normal como um jogo de quebra-cabeças. Aqui ele discorre sobrea definição e categorização de “elementos” ou “termos”. A discussão filosófica envolvida no capítulo advém da necessidade de definirmos o termo “jogo”. Ainda que seja um termo difícil de definir, o ponto do autor é que, dado um conjunto de características identificáveis como “jogo” podemos classificar “algo” como jogo ou não.

 

Da mesma forma, cientistas nunca aprendem conceitos de maneira isolada. Cada teoria tem um contexto e uma séria de características identificáveis que a tornam única e articulável. A forma como a teoria é colocada com o momento histórico também altera a percepção de seus praticantes e da sociedade ao recebê-la. Ainda, a modificação de um paradigma, ou de um simples conceito dentro de uma teoria maior pode ser revolucionária apenas para um pequeno grupo de cientistas que trabalha diretamente com a ideia.

 

O trecho final do capítulo nos relembra de que até na ciência os paradigmas são dúbios e podem funcionar bem. Um físico pode olhar para um único átomo de hélio e vê-lo como uma molécula porque se comportava como tal segundo o ponto de vista da teoria cinética dos gases. Um químico, por outro lado, não vê o átomo como molécula pois a partícula não tem espectro molecular. Assim a definição “molécula” varia em ambos os campos e funciona em ambos os campos.

 

Não há prioridade entre paradigmas se ambos funcionam em suas zonas específicas de estudo.

A anomalia e a emergência das descobertas científicas

Na leitura do livro (e talvez desse resumo) pode-se ter a impressão que o autor menospreza a ciência normal e seu funcionamento. Confesso que não cheguei a nenhuma conclusão quanto a essa posição, mas a abertura do 5º capítulo do livro deixa claro que “a ciência normal é bem sucedida quanto a seu propósito, que é a ampliação contínua do conhecimento com precisão”. Assim, mais uma vez, Kuhn afirma que a ciência normal não busca a inovação de fatos ou teorias, contudo, o surgimento de fenômenos inesperados é inevitável, a esses fenômenos, chamamos de anomalias.

 

Uma descoberta cientifica inicia-se, necessariamente, com a conscientização da anomalia. É preciso romper com a pré-discriminação imposta de que o resultado não esperado é culpa do pesquisador ou do experimento. O reconhecimento de uma anomalia geralmente se dá após várias tentativas frustradas e várias evidências de “anomalias”. Uma anomalia envolve um fenômeno não corresponder às expectativas do paradigma vigente.

 

O trabalho se encerra quando a teoria é articulada para responder ao evento inesperado ou um novo paradigma é adotado.

 

Kuhn também filosofa sobre a necessidade humana de atribuir uma descoberta a um indivíduo específico. Ele demonstra por exemplos como uma descoberta é complexa e não deveríamos ser tão fissurados por essa necessidade. “uma descoberta envolve tanto o reconhecimento da existência de algo como de sua natureza”. Pois somente após o amadurecimento de um novo paradigma é que podemos de fato “descobrir algo”, e muitas vezes o “descobridor original”, que lida com a anomalia “em primeira mão” é desmerecido de sua investigação.

Ainda sobre reconhecimento de anomalias, o autor exemplifica um experimento que nos lembra do famoso Rápido e Devagar. 

 

O experimento em questão controlou diversos sujeitos a observar uma série de cartas de baralho por um tempo determinado. Algumas cartas eram alteradas (anomalias) como um seis de espada vermelho. As cartas anômalas eram passadas despercebidas, e foram identificadas apenas após uma exposição maior às cartas. Ainda assim, certa hesitação foi demonstrada. Mesmo com um tempo médio de exposição superior a 40 vezes, mais de 10% das cartas anômalas não foram identificadas corretamente. Esse experimento é mais um “puxão de orelha” para nós, humanos. Temos a tendência de enquadrar tudo o que vemos a padrões pré-concebidos, mesmo diante de evidências tão claras, negamos o que foge à regra.

 

Na ciência (ou na experiência do baralho alterado), a novidade emerge com dificuldade, pois luta com um pano de fundo que fornece expectativas. Como humanos, tendemos a preencher as expectativas e ir contra elas nos parece errado. A ciência molda seus praticantes na teoria vigente, com termos, aparelhos e técnicas aptas a preencher as expectativas. Assim, criamos uma barreira natural ao novo, à mudança de paradigma. Da mesma forma, é essa barreira que permite avanços em graus cada vez mais precisos.

As crises e a emergência das teorias científicas

Espera-se que, após o reconhecimento da(s) anomalia(s) e a assimilação da descoberta, um novo paradigma seja enquadrado, um conjunto de ideias que resolvem mais problemas e é mais preciso nas suas soluções que a última teoria aceita. Esse avanço científico é possível apenas porque as antigas ideias foram substituídas instantaneamente por outras.

 

Essa colocação de Kuhn é importante pois ele destaca que, não existe na ciência um momento “de limbo”. Em que a sociedade aceita que o paradigma atual está errado. Esse consenso só existe após um candidato concorrente ter sua vitória declarada. Em muitos casos destacados no livro, o fracasso de várias teorias iniciou-se uma ou duas décadas antes do enunciado da nova teoria. Durante esse período a nova teoria não fora declarada incorreta, apenas alguns cientistas lidavam com problemas em que a teoria não era falha e continuavam seu trabalho, enquanto, outros, intrigados e com quebra-cabeças insolúveis, tentavam compreender se o problema estava na teoria ou no experimento.

 

Esse período entre a coleta de fracassos e dubiedade é denominado crise. Cabe aos cientistas dar uma resposta a ela.

A resposta à crise

A resposta à crise acontece por meio da comparação de paradigmas com a natureza e sua comparação mútua. Decidir que um paradigma será adotado significa colocar a(s) outra(s) opção(es) de lado. Da mesma forma, rejeitar um paradigma sem substituí-lo imediatamente por outro seria rejeitar a própria ciência, pois essa tem como propósito aproximar a teoria dos fatos, e deixar a ciência desamparada, mesmo que por um instante, seria o caos.

 

Assim, a ciência normal é conduzida pela busca da confirmação das teorias, sempre orientada muito mais em culpar o cientista que a teoria em si. Isso também se evidencia na maneira como nossa sociedade se organiza, ao repassar as teorias vigentes para os estudantes, estes as aceitam muito mais pela autoridade do professor do que pela prova apresentada. As provas, geralmente são apresentadas apenas para estudantes que se aprofundam em uma matéria e já possuem anos de estudos.

 

As crises se iniciam então com o obscurecimento do paradigma atual devido a uma anomalia (ou uma série de anomalias) que incomoda o grupo de pesquisadores, que relaxam as regras da pesquisa normal e buscam por um novo discurso, que justifique a anomalia. Esse discurso pode ser enquadrado ou não no paradigma atual, a depender do grau da anomalia.

 

Kuhn também aponta como os “heróis” das crises geralmente são jovens, e sua justificativa é que eles, sendo tão novos no estudo, possuem menor apego pelas regras tradicionais e, portanto, são menos limitados em criar uma maneira diferente de pensar e reorganizar os dados.

A natureza e a necessidade das revoluções científicas

“ As revoluções políticas iniciam-se com um sentimento crescente, com frequência restrito a um segmento da comunidade política, de que as instituições existentes deixaram de responder adequadamente aos problemas postos por um meio que ajudaram em parte a criar. De forma muito semelhante, as revoluções científicas iniciam-se com um sentimento crescente, também seguidamente restrito a uma pequena subdivisão da comunidade científica, de que o paradigma existente deixou de funcionar adequadamente na exploração de um aspecto da natureza, cuja exploração fora anteriormente dirigida pelo paradigma.”

 

Revoluções científicas precisam parecer extraordinárias somente para aqueles cujos paradigmas sejam afetados por elas. Para observadores externos, podem parecer etapas normais de um processo de desenvolvimento, tal como as revoluções balcânicas no começo do século XX. Os astrônomos, por exemplo, podiam aceitar os raios X como uma simples adição ao conhecimento, pois seus paradigmas não foram afetados pela existência de uma nova radiação. Mas, para Kelvin, Crooks e Roentgen, cujas pesquisas tratavam de radiação e tubos de raios catódicos, o surgimento dos raios X violou inevitavelmente um paradigma ao criar outro.

 

As revoluções políticas visam realizar mudanças nas instituições que são proibidas pelas instituições vigentes. Assim, para que uma revolução política ocorra, há um período em que a sociedade não é governada por nenhuma instituição. Já a escolha de paradigmas em competição é algo que se deve dar de maneira simultânea pois são incompatíveis per se.

 

A discussão entre comunidades científica de qual paradigma adotar é um processo confuso pois cada grupo utilizará seu próprio paradigma como base de argumentação, visto que não existe um framework de debate em que ambos os paradigmas se encaixam.

 

“À medida que os problemas mudam, mudam também os padrões que distinguem uma verdadeira solução científica de uma simples especulação metafísica, de um jogo de palavras ou de uma brincadeira matemática. A tradição científica normal que emerge de uma revolução científica é não apenas incompatível, mas muitas vezes verdadeiramente incomensurável com aquela que a precedeu”

 

“quando os paradigmas mudam, também muda os critérios que legitimam um problema (se ele é ou não relevante pra sociedade) e se as soluções propostas permanecem válidas”. Assim, a mudança de paradigma pode acarretar na mudança de todo um campo da ciência (e por vezes transforma não só um campo, mas todo o mundo). Além disso, como já exposto, cada paradigma abarca uma classe distinta de problemas e soluções, e o debate do “melhor” paradigma, também envolve a seleção dos problemas mais relevantes e das soluções mais aceitáveis para a sociedade na época.

As revoluções como mudanças de concepção e mundo

Embora o mundo não mude, de facto, após uma mudança de paradigma, o cientista que é impactado pela mudança passa a enxergar o mundo de maneira diferente. Em realidade, o mundo, na perspectiva do cientista foi alterado.

 

Um paradigma estabelece o que é o dado, quais instrumentos utilizar para analisá-lo e quais conceitos eram usados na interpretação da informação. Um novo paradigma re-enquadra todas essas questões, e o cientista precisa aprender a viver nesse novo mundo.

 

Ainda há a questão de que “O que um homem vê depende tanto daquilo que ele olha como daquilo que sua experiência visual-conceitual prévia o ensinou a ver”. É a questão da jovem e da velha, em que duas pessoas, a partir da mesma imagem vêm coisas distintas. O paradigma tenta criar um discurso único, mas nem sempre isso é possível (como no caso da molécula acima). 

 

Assim, não importa o que o cientista vê, o mundo segue igual. Todo o resto é linguagem, é a forma que encontramos de nos comunicar, são instrumentos usados para experimentar e testar teorias, cada hora sob uma nova abordagem, guiada pelo paradigma vigente.

A invisibilidade das revoluções

Kuhn, depois de filosofar entre a mudança de mundo que na realidade não mudou, ainda discute como as revoluções terminam.

 

A ideia de que a ciência normal é construtiva, e que é passada por gerações a partir dos manuais que sintetizam as teorias e paradigmas já estabelecidos é o cerne da questão que intitula o capítulo. A cada nova ruptura, a de se reescrever os manuais, e nesse processo, tudo que antes “era errado” é apagado da história, pois o objetivo do manual é apenas passar o que de mais atual e sólido existe em uma área da ciência.

 

“Assim, os manuais começam truncando a compreensão do cientista a respeito da história de sua própria disciplina e em seguida fornecem um substituto para quilo que eliminaram.”

 

Essa reescrita dos fatos é compreensível e benéfica para a pedagogia, para o ensino e para a transmissão do conhecimento. Contudo, é importante ressaltar que esse método gera falsa impressão que, a ciência é aditiva linearmente e que cada cientista do passado contribuiu e trabalhou de maneira coordenada para realizar os objetivos específicos que o manual revela, quando, a realidade histórica revela um caminho bem mais tortuoso.

A revolução das revoluções

Já foi falado que o paradigma só cai quando o fracasso de resolver um problema é persistente a um nível impossível de continuar culpando o cientista, seu método ou instrumentos. A aceitação de um paradigma, por não ser diretamente verificável, é feita de maneira probabilística, escolhe-se a alternativa mais viável, dentro do espectro de problemas que consideramos relevantes.

 

 

É importante frisar que nenhuma teoria abarca todos os problemas e contém todas as soluções. Assim, o fracasso em adaptar um problema a uma determinada teoria não é motivo de rejeição direta de um paradigma, justamente porque lidamos com probabilidades.

 

Cientistas, como qualquer ser humano, têm dificuldades em desgarrasse de suas teorias, mesmo quando defrontados com evidências de que um paradigma não explica mais tão bem os fenômenos. Assim, a probabilidade que determina a aceitação de uma teoria, não é uma fórmula matemática e exata, e sim mais um consenso, uma batalha ideológica e humana, como em qualquer outra área, de quem está “mais certo”. Por vezes, só com as novas gerações é que um novo paradigma ganha força para substituir outro.

 

Kuhn chega a afirmar que, para que um paradigma seja eleito,é preciso ter fé. Uma fé que não precisa ser racional nem correta

O progresso através de revoluções

Aqui, a reflexão gira em torno da nossa capacidade humana de limitar e definir o que é ciência (áreas que progridem de uma maneira óbvia). Seríamos capazes de definir quem é ou não um cientista. Por muitos anos, na antiguidade, a pintura era ciência por excelência e seu objetivo era representação fiel da realidade. A separação entre ciência e arte ocorreu em algum ponto da história, e mais tarde a própria arte expandiu-se não só parra a representação, mas como uma linguagem de expressão. O autor então chega à pergunta, do ovo e da galinha: um campo de estudos é uma ciência porque progride, ou progride porque é uma ciência?

 

Essa pergunta é o chamariz para um ponto que ronda toda a obra: de que revoluções não nos levam necessariamente à verdade. Acreditamos nisso, e é necessário que acreditemos, mas, as perguntas finais de Kuhn em seu capítulo final são tão abertas que fui incapaz de resumi-las aqui.

 

Seu fechamento é um resumo de toda a discussão de sua obra, e sua pergunta final: “o que deve ser o mundo para que o homem possa conhecê-lo?”, permanece sem resposta

Ao reler minhas anotações, chego à conclusão que consegui tirar sim certo proveito da leitura. Como falei, o ensaio é denso, e espero ter sintetizado aqui as ideias de Kuhn de maneira fiel. Esse livro nos fás refletir, mais uma vez, sobre nossas condições humana de negar fatos quando nossa fé na teoria é histórica. E traz um lembrete doloroso: que a ciência é feita de humanos.

 

E você, Kuhn fez você rever conceitos e seu olhar pra ciência?

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